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quarta-feira, 29 de junho de 2011

Crise terminal do capitalismo?

Por Leonardo Boff


Tenho sustentado que a crise atual do capitalismo é mais que conjuntural e estrutural. É terminal. Chegou ao fim o gênio do capitalismo de sempre adaptar-se a qualquer circunstância. Estou consciente de que são poucos que representam esta tese. No entanto, duas razões me levam a esta interpretação.


A primeira é a seguinte: a crise é terminal porque todos nós, mas particularmente, o capitalismo, encostamos nos limites da Terra. Ocupamos, depredando, todo o planeta, desfazendo seu sutil equilíbrio e exaurindo excessivamente seus bens e serviços a ponto de ele não conseguir, sozinho, repor o que lhes foi sequestrado. Já nos meados do século XIX, Karl Marx escreveu profeticamente que a tendência do capital ia na direção de destruir as duas fontes de sua riqueza e reprodução: a natureza e o trabalho. É o que está ocorrendo.

A natureza, efetivamente, se encontra sob grave estresse, como nunca esteve antes, pelo menos no último século, abstraindo das 15 grandes dizimações que conheceu em sua história de mais de quatro bilhões de anos. Os eventos extremos verificáveis em todas as regiões e as mudanças climáticas tendendo a um crescente aquecimento global falam em favor da tese de Marx. Como o capitalismo vai se reproduzir sem a natureza? Deu com a cara num limite intransponível.

O trabalho está sendo por ele precarizado ou prescindido. Há grande desenvolvimento sem trabalho. O aparelho produtivo informatizado e robotizado produz mais e melhor, com quase nenhum trabalho. A consequência direta é o desemprego estrutural.

Milhões nunca mais vão ingressar no mundo do trabalho, sequer no exército de reserva. O trabalho, da dependência do capital, passou à prescindência. Na Espanha o desemprego atinge 20% no geral e 40% e entre os jovens. Em Portugal, 12% no pais, e 30% entre os jovens. Isso significa grave crise social, assolando neste momento a Grécia. Sacrifica-se toda uma sociedade em nome de uma economia, feita não para atender as demandas humanas mas para pagar a dívida com bancos e com o sistema financeiro. Marx tem razão: o trabalho explorado já não é mais fonte de riqueza. É a máquina.

A segunda razão está ligada à crise humanitária que o capitalismo está gerando. Antes se restringia aos países periféricos. Hoje é global e atingiu os países centrais. Não se pode resolver a questão econômica desmontando a sociedade. As vítimas, entrelaças por novas avenidas de comunicação, resistem, se rebelam e ameaçam a ordem vigente. Mais e mais pessoas, especialmente jovens, não estão aceitando a lógica perversa da economia política capitalista: a ditadura das finanças que via mercado submete os Estados aos seus interesses e o rentitentismo dos capitais especulativos que circulam de bolsas em bolsas, auferindo ganhos sem produzir absolutamente nada a não ser mais dinheiro para seus rentistas.

Mas foi o próprio sistema do capital que criou o veneno que o pode matar: ao exigir dos trabalhadores uma formação técnica cada vez mais aprimorada para estar à altura do crescimento acelerado e de maior competitividade, involuntariamente criou pessoas que pensam. Estas, lentamente, vão descobrindo a perversidade do sistema que esfola as pessoas em nome da acumulação meramente material, que se mostra sem coração ao exigir mais e mais eficiência a ponto de levar os trabalhadores ao estresse profundo, ao desespero e, não raro, ao suicídio, como ocorre em vários países e também no Brasil.

As ruas de vários países europeus e árabes, os "indignados" que enchem as praças de Espanha e da Grécia são manifestação de revolta contra o sistema político vigente a reboque do mercado e da lógica do capital. Os jovens espanhois gritam: "não é crise, é ladroagem". Os ladrões estão refestelados em Wall Street, no FMI e no Banco Central Europeu, quer dizer, são os sumo-sacerdotes do capital globalizado e explorador.

Ao agravar-se a crise, crescerão as multidões, pelo mundo afora, que não aguentam mais as consequências da super-exploracão de suas vidas e da vida da Terra e se rebelam contra este sistema econômico que faz o que bem entende e que agora agoniza, não por envelhecimento, mas por força do veneno e das contradições que criou, castigando a Mãe Terra e penalizando a vida de seus filhos e filhas.

Leonardo Boff é teólogo e escritor, autor do livro "Proteger a Terra – cuidar da vida: como evitar o fim do mundo" (Record 2010).

terça-feira, 28 de junho de 2011

Pernambuco: a República de marcha-ré

Por Edilson Silva

A Assembleia Legislativa de Pernambuco aprovou há poucos dias uma Proposta de Emenda Constitucional que permite à atual Mesa Diretora do Poder Legislativo a sua re-reeleição. Em sete anos é a terceira vez que uma alteração constitucional é feita neste tema para atender a conveniências conjunturais.

Em tempos de reforma política na pauta da sociedade, é sintomática a decisão dos 38 deputados estaduais que decidiram, sobre nove contrários, pela aprovação da Emenda Constitucional. A República em Pernambuco está se esfarelando, neste e em outros aspectos, mas o crescimento “chinês” da economia em nosso Estado por enquanto vai justificando a desconstrução.

A sociedade, sobretudo em seus setores mais esclarecidos, formadores de opinião, ou vinculados organicamente com a luta democrática, como a OAB, preocupa-se neste momento com o combate à corrupção, com a diminuição do fosso que separa os poderes públicos das demandas populares, com a consolidação do estado democrático de direito. Preocupa-se, em síntese, com a modernização da democracia, com o aperfeiçoamento dos mecanismos de Controle Social, de participação popular.

Na mesma direção, os ventos que sopram da Europa nestes dias, como das praças da Espanha, trazem o olor do Maio Francês dos idos 1968. Este aroma democrático agradável contrasta com a fedentina de creolina exalada do plenário da Assembleia Legislativa de Pernambuco nos últimos dias. O artíficie mor da produção do mau cheiro não se faz de rogado, e proclama: “falem de mim!”, numa uma espécie de “estou me lixando para a opinião pública”, daquele deputado do castelo.

O problema é que a Casa de Joaquim Nabuco não é o quintal do mandato do nobre deputado que gosta que falem dele, mesmo que das suas desvirtudes. Aquela Casa é um dos Poderes da República nesta unidade da Federação. Como Poder, deveria negar-se a se transformar em mero anexo do Poder Executivo, como o fez agora, pois está claro que a força dos votos que rasgaram a Constituição Estadual vieram dos interesses anti-republicanos do Palácio do Campo das Princesas, de onde, tudo indica, saíram o mando e a autoria intelectual da manobra que, se escapar da ilegalidade, não foge de jeito algum da mais vulgar imoralidade política.

Ao tratar a Constituição Estadual como um mero regimento interno de um clubinho de futebol de várzea desorganizado – pois nos organizados as normas são minimamente rígidas, Pernambuco colocou-se em marcha-ré em sua necessária escalada republicana. Aqui não avançamos na independência do Tribunal de Contas; não avançamos no Controle Social sobre a Jurisdição; não avançamos na democratização dos meios de comunicação. Aqui se retrocede na independência dos poderes e na necessária segurança jurídica nos temas da ordem democrática.

Não foi por outro motivo que o PSOL dirigiu-se à Assembleia Legislativa no dia da votação da famigerada PEC da re-reeleição. Fomos lá, com nossas bandeiras, nossa coragem e coerência, dar o nosso voto simbólico contra a pouca vergonha que iria ser votada. Aproveitamos a oportunidade para distribuir marmelada aos presentes, num ato de repúdio ao que ali estava acontecendo, uma verdadeira peça circense – com todo respeito a estes espetáculos.

A luta sobre este tema não pode encerrar-se. Dentro de nossos limites vamos continuar denunciando e buscando os meios possíveis para desfazer este absurdo, pois não podemos aceitar passivamente retrocessos na pouca democracia que temos.

* Edilson Silva é presidente do PSOL-PE
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quinta-feira, 16 de junho de 2011

Estacionamentos: mesmo no caos deve-se buscar o equilíbrio

Por Edilson Silva

Não há vagas. A negativa não trata de vagas para empregos, mas para estacionar os carros. Sinal dos tempos. O assunto mobiliza a sociedade. Nos últimos dias, a decisão judicial que liberou geral o estacionamento em shoppings e outros estabelecimentos, e que foi reformada parcialmente dias depois, gerou muita controvérsia. O tema, apesar de aparentar superficialidade, tem em seu pano de fundo questões estruturais para a sociedade no espaço urbano.

Meu realismo talvez não seja muito animador, mas enquanto o problema relacionado ao que fazer para garantir a mobilidade de veículos estiver relacionado às vagas para estacionar, ainda não estaremos no fundo do poço. Digo isto por que há o risco real de num curto período de tempo faltar mesmo pistas para tantos carros. Transferindo o raciocínio para os veículos que não precisam estacionar, mas tão somente se locomover, os engarrafamentos terríveis de hoje podem ser um sonho de felicidade num futuro não muito distante.

Não há criatividade de prefeito ou governante que tire de vigência a lei segundo a qual dois carros não ocupam o mesmo lugar no espaço. Detalhe: a legislação de transito baseia-se em boa medida nesta afirmação da Física. Alguns motoristas até tentam burlar esta lei, de forma involuntária, é claro, mas o fenômeno resultante é indesejável e é popularmente conhecido como batida, acidente ou desastre, este último quando as conseqüências são mais graves, às vezes até com mais de dois carros buscando ocupar o mesmo espaço físico.

Diminuir o tamanho dos carros ajuda um pouco. Alargar as vias também. Fazer pistas elevadas também. Impor rodízio de carros por numeração de placa é uma contradição com a lógica de quem compra um carro, levando-o a trabalhar a hipótese de comprar mais um, com uma placa diferente, que lhe permita usufruir do direito subjetivo de locomover-se com seu automóvel sempre que quiser e precisar. Não carece ser gênio para perceber que a adaptação permanente da sociedade ao automóvel é um erro. Tudo o que for feito, se não passar com majoritariedade pelo transporte público, coletivo, de massas, com prioridade para os modais sobre trilhos e fluviais, não passará de analgésico de efeito efêmero.

Mas voltemos aos estacionamentos. Mesmo nesta desordem, é preciso buscar-se um equilíbrio. Não sou adepto do quanto pior melhor. De onde vejo a questão, não me parece justo que os estacionamentos de estabelecimentos comerciais sejam gratuitos de forma indiscriminada. Se há lei que ampare isto, a lei está caduca. Por outro lado, também não me parece justo que uma família vá a um restaurante consumir e tenha que pagar pelo estacionamento na área do restaurante; assim como um estudante de uma faculdade ter que pagar para estacionar no pátio da instituição; ou um paciente ter que pagar pelo estacionamento do hospital. Está faltando equilíbrio nesta contenda.

O caso dos shoppings foi dos que mais chamou a atenção, dada a importância que ganharam na vida moderna das grandes cidades, e Recife e as cidades maiores de seu entorno não fogem à regra. Os shoppings devem e podem proporcionar conforto aos seus freqüentadores e consumidores, sem que para isto tenham que cobrar de forma apartada de quem utiliza seus estacionamentos. A apresentação de nota fiscal de estabelecimento comercial do shopping, devidamente datada, poderia até ser com consumação mínima, deveria ser suficiente para dar o direito à gratuidade em determinado período de tempo. Lamentavelmente, as administrações dos shoppings querem fazer do estacionamento um negócio à parte. Isso não é justo com seus consumidores.

Presidente do PSOL-PE
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segunda-feira, 13 de junho de 2011

Eduardo Galeano nas mobilizações espanholas: mais um Indignado!

GREVE DOS SERVIDORES DA CPRH - Carta Aberta à Sociedade

Texto distribuído pelo SINTAPE e funcionários da CPRH durante
solenidade do Prêmio Vasconcelos Sobrinho.

Hoje, Sexta-feira, 10 de Junho de 2011, a Agência Estadual de Meio Ambiente – CPRH realiza a XXI Edição do Prêmio Vasconcelos Sobrinho. Mas você sabe quem foi Vasconcelos Sobrinho?

João Vasconcelos Sobrinho nasceu no dia 28 de abril de 1908, em Moreno - PE. Pioneiro na área dos estudos ambientais no Brasil foi considerado em seu tempo uma das maiores autoridades em ecologia da América Latina. Faleceu em 1989 e em sua homenagem a CPRH atribui, desde 1990, o Prêmio Vasconcelos Sobrinho. Portanto, aqueles que o recebem devem se sentir honrados, pois são reconhecidos como sucessores do seu legado.

Entretanto, se Vasconcelos Sobrinho estivesse vivo: será que ele gostaria de ver seu nome emprestado a um prêmio concedido por uma Agência Estadual de Meio Ambiente que, nas atuais condições, pouco faz pelo meio ambiente em Pernambuco?

Da porta para fora, caro leitor, a CPRH passa a imagem de uma instituição séria e comprometida com a causa ambiental. Contudo, a realidade é bem diferente.

· Funcionários desvalorizados, sem plano de cargos e carreiras e com vencimentos inferiores aos de Agências que desempenham funções semalhantes.

· Não houve nenhum treinamento para atender a totalidade do corpo funcional.

· Dos 348 nomeados através do Concurso Público realizado em 2008, mais de 140 desistiram da vaga, em grande parte devido às condições de trabalho e à baixa remuneração.

· Existencia de pressões e constragimentos em ambiente de trabalho.

· Há setores na CPRH que contam atualmente com apenas 1 funcionário.

· Há uma sobrecarga intensa de processos na pauta dos analistas e técnicos ambientais, algumas com mais de duzentos processos.

· Servidores desenvolvendo atividades que demandam conhecimento de áreas divergentes de sua formação.

· A nova sede, que deveria estar concluída desde 2010, sequer teve suas obras iniciadas.

· O laboratório da CPRH funciona em condições precárias: alagamentos, falta de materiais, entre outros.

· Atualmente o espaço destinado a refeição, confraternização e descanso dos funcionários encontra-se sob ameaça de desativação pela diretoria.

Nosso pleito é por condições de trabalho que possibilitem dar cumprimento à nossa missão: garantir o exercicio das atribuições legais desta Agência e o respeito ao meio ambiente

Visite nosso blog, conheça o nosso movimento, entenda melhor o nosso pleito, junte-se à nossa causa, lute conosco por um Pernambuco sustentável não apenas nos discursos, mas na prática.

Blog: http://www.meioambientesociedadeevozes.blogspot.com

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sábado, 11 de junho de 2011

Superávit primário e o governo Dilma

Por Paulo Kliass, no sítio Carta Maior:

A intensidade do destaque nas manchetes dos jornais ou nas chamadas das redes de televisão costuma variar de acordo com as exigências políticas do momento do anúncio. Nestes últimos dias, por exemplo, pouco se ouviu falar a respeito da divulgação dos números da execução fiscal e monetária do governo.

Mas não nos deixemos enganar pelas aparências. A firmeza com que as autoridades econômicas e a Presidenta resolveram encaminhar a solução ortodoxa para nossa economia, desde o começo de janeiro, continua a todo vapor. Mas o momento da apresentação dos resultados do superávit primário exigia um pouco mais de cautela. E assim foi feito. Afinal, tratava-se de período fortemente abalado pela crise de seu Ministro da Casa Civil envolvido em denúncias de súbito enriquecimento milionário, marcado pelo anúncio da inesperada privatização do sistema aeroportuário com o argumento de falta de recursos orçamentários e também lembrado pela divulgação do programa do governo federal destinado a eliminar a miséria. Falar em cifras bilionárias para usos tão obscuros, como os juros, não cabia muito bem no figurino recomendado.

Mas o superávit fiscal primário continua firme e forte! Os operadores do mercado financeiro e os interesses das grandes instituições bancárias não têm muito com o que se preocupar! O compromisso do governo com a transferência de vultosos recursos do orçamento público para a finalidade de pagamento de juros da dívida pública está mais do que assegurado. Na verdade, ele continua se realizando no nosso dia-a-dia, fazendo com que a drenagem de recursos arrecadados de toda a população por meio dos impostos seja direcionada para as contas de muito poucos - as elites que continuam a se locupletar com a irresponsabilidade de um governo que fala para muitos e beneficia, de fato, a bem poucos.

Apenas para recordar, o conceito de “superávit fiscal primário” corresponde a um eufemismo, criado pelos especialistas do mundo financeiro para assegurar que o esforço dos governos na manutenção do necessário equilíbrio entre suas receitas e suas despesas ganhasse uma sutil armadilha. Não basta mais apenas ser eficiente na gestão fiscal pura e simples. É necessário sempre gerar um superávit (nada contra, em princípio), mas o detalhe da perversidade vem depois: que estes recursos sejam direcionados para gastos com o pagamento de juros da dívida pública. Ou seja, tudo se passa como esse tipo de gasto orçamentário não fosse uma despesa.... Corta-se em educação, em saúde, em transporte, em infra-estrutura, enfim faz-se um grande esforço fiscal para ... acumular recursos e dirigi-los para a mais estéril de todas as despesas – a de natureza financeira. Não nos esqueçamos que estamos ainda sob a égide do corte de R$ 50 bi no Orçamento federal, anunciado no começo de fevereiro.

Os dados são oficiais. Durante os 4 primeiros meses do governo da Presidenta Dilma o resultado do superávit fiscal atingiu a incrível marca de R$ 57,3 bilhões! Ou seja, apenas entre janeiro e abril, o governo restringiu os gastos, fechou os torniquetes e conseguiu realizar mais de 50% do esforço previsto para todo o ano de 2011. Estamos destinando para essa rubrica o equivalente a 4,5% do nosso Produto Interno Bruto.

Mas os números que mais entristecem, ou nos indignam, são os relativos ao pagamento de juros. Ali, o relatório do Banco Central parece não ter problema algum de consciência ao informar que, ao longo dos mesmos 4 meses, o governo transferiu o montante de R$ 78,6 bi para o pagamento de juros da dívida pública, equivalente a 6,2% do PIB.

Pois é, pelos valores envolvidos e pela obstinação em atingir as metas, como bom aluno esforçado, tudo indica que essa continua a ser a verdadeira prioridade dos que estão no comando do nosso aparelho de Estado: transferir recursos para o setor financeiro!

Mas como governar exige também outras decisões e medidas para além de satisfazer as necessidades dos poderosos do mercado financeiro, a equipe da presidenta vai tocando o barco do jeito que pode.

A ampliação e a modernização da rede aeroportuária é exigência antiga. A polêmica e arriscada decisão de trazer a Copa do Mundo para cá em 2014 só sublinhou o atraso de nossas instalações. Mas como o governo insiste em afirmar que “não tem recursos”, optou-se pelo modelo da privatização dos aeroportos. O fato que ninguém menciona é que as tais “vultosas” necessidades de investimento seriam tranquilamente cobertas por um desvio de rota dos recursos do pagamento de juros. Os valores dos investimentos necessários para o setor variam de acordo com a paternidade dos estudos considerados, mas em geral oscilam entre R$ 8 bi e R$ 30 bi ao longo de vários anos, com uma média de dispêndio anual não superior a R$ 3 bi. Ora, apenas durante o mês de março o governo transferiu R$ 21 bi para o setor financeiro sob a forma de juros. Isso equivale a quase R$ 1 bi por dia útil. É incrível, mas bastariam apenas 3 dias para assegurar à Infraero os recursos para as obras necessárias ao longo do ano todo! Mas, não! Com o falacioso argumento de que não há recursos, o governo optou por ceder a concessão por 20 anos aos consórcios privados. Fico só imaginando, aqui com meus botões, como vão se dar as pressões e chantagens pela obtenção de reajustes das tarifas lá em 2029...

No dia seguinte à divulgação dos resultados do superávit primário, a Presidenta anunciou com muita pompa um de seus compromissos de campanha, a política de erradicação da miséria. Perfeito! Excelente medida, um mínimo que o nosso País tinha mesmo que fazer no caminho da redução das desigualdades. Mas, nos aprofundemos um pouco mais, para além das aparências. O novo Programa incorpora as políticas do já existente Bolsa Família e as amplia, incorporando mais famílias beneficiadas e atingindo outras áreas, com complementação de programas em educação, saúde, capacitação profissional, agricultura familiar, preservação ambiental etc.

Porém, os números apresentados são referentes aos programas consolidados. Ao longo dos 4 anos de governo, a equipe de Dilma pretende alocar R$ 80 bilhões. Ou seja, entre 2011 e 2014 deverá um gasto anual de R$ 20 bilhões. Ora, mas apenas o Bolsa Família já tinha previsão orçamentária superior a R$ 16 bi para o presente ano. E esses valores pretendem atingir um universo de mais de 16 milhões de pessoas.

Quem tiver a curiosidade de comparar os valores, chegará à conclusão que, apenas nos 4 primeiros meses deste ano, o governo já gastou na esfera financeira o equivalente a esse programa quadrienal. Sim, pois já transferiu quase R$ 80 bi para o pagamento de juros, que beneficiam uma parcela substancialmente mais reduzida que aqueles milhões de famílias.

Ao invés de sinalizar com mudanças de orientação, o governo parece só confirmar suas verdadeiras prioridades, aquelas que consomem as quantias expressivas de seus recursos. Dias 7 e 8 de junho teremos a nova reunião do COPOM, que deverá decidir sobre a SELIC, a taxa de juros oficial. Atualmente ela está definida no patamar de 12%. Com o valor da dívida pública federal em R$ 1,65 trilhão, caso não haja redução da taxa, os valores gastos com pagamento de juros ao longo do presente ano certamente serão superiores a R$ 200 bi.

Por outro lado, no governo concreto e real, aquele que deve lidar com pessoas, escolas, hospitais, estradas, reforma agrária, etc a coisa é bem diferente. A cada pleito na definição de novas políticas públicas voltadas para a maioria, os interessados pouco conseguem fazer, pois os ministérios têm suas verbas contingenciadas. A resposta é sempre a mesma: “não há recursos disponíveis”...

Como vimos, cada qual escolhe suas prioridades.

sexta-feira, 10 de junho de 2011

A ALEPE no organograma do poder Executivo

Por Edilson Silva

Está aberta uma polêmica sobre a proposta de emenda à Constituição Estadual estabelecendo nova reeleição para a Mesa Diretora da Casa. Para além das corretas críticas que estão sendo feitas ao patrimonialismo exercido por aqueles que querem se perpetuar na condição de supostos condutores deste Poder, há um fator que deveria preocupar ainda mais a sociedade.

Trata-se da captura do Poder Legislativo pelo Executivo. É indisfarçável o desejo, a vontade e a necessidade do governo do Estado em manter os cargos da Assembleia sob seu controle. Controle que lhe permitiu, por exemplo, dar posse aos suplentes de partidos na Casa, em polêmica recente, quando as vagas, pelas regras jogadas, eram das coligações, como se confirmou posteriormente.

O Palácio do Campo das Princesas parece ter colocado, definitivamente, a Assembleia Legislativa em seu organograma funcional. No topo, o chefe do Executivo, o governador. Logo abaixo, sob suas ordens, as secretarias, lado a lado com os cargos da mesa diretora da Assembleia Legislativa. Os arranjos políticos e as acomodações fisiológicas têm na ALEPE parte do joguete entre os aliados.

Do ponto de vista político, institucional, republicano, é muito ruim que as coisas estejam assim. Contudo, é bem pior quando, em nome desta subordinação, se disponham a mutilar a Constituição Estadual. Fazer um arranjo de ordem constitucional para dar amparo a um casuísmo deste quilate mostra a que ponto se chegou em Pernambuco.

Nossa Constituição Estadual estará sendo “elevada” à condição de um frágil pedaço de papel, uma espécie de anexo do Regimento Interno da Assembleia Legislativa. Será muito vergonhoso para os deputados se a sua maioria aprovar este absurdo. Sinceramente, espero que esta proposta não prospere.

Presidente do PSOL-PE

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