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segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Avaliação política do Diretório Nacional do PSOL


Diretório Nacional do PSOL enfrenta questões estratégicas,
de concepção partidária e avança para fortalecimento da esquerda brasileira
 
 

 A reunião do DN do PSOL no último final de semana foi um marco para o partido. Realizada após uma campanha eleitoral inequivocamente vitoriosa em 2012, o fórum máximo de deliberação - abaixo apenas de nosso congresso, aconteceu sob forte pressão de um setor do PSOL que queria transformar nossas vitórias em derrotas. Uma maioria consistente, contudo, soube fazer as reflexões necessárias sobre os equívocos e desequilíbrios táticos havidos – naturais aos que se lançam nas disputas de massas -, e inseri-los dentro de um balanço vitorioso e de um partido que saiu absolutamente fortalecido das urnas em 2012. Restou aprovado, mais uma vez, a reafirmação de um norte de concepção partidária e a dimensão estratégica onde esta concepção se localiza.

O DN começou enfrentando uma situação de ordem metodológica, que acaba guardando aspectos de natureza estratégica também, pois método, política e ética são no fundo inseparáveis: a reabilitação do dirigente Martiniano Cavalcante, que havia sido suspenso de seus postos de direção a partir de decisão precária da Executiva Nacional. Neste debate, o partido encerrou um aprendizado e precisou fazer um desagravo ao destacado dirigente, pois a decisão de afastá-lo e enviá-lo à Comissão de Ética, sem observar os procedimentos mínimos necessários para estes casos - além dos fatos já terem desfechado sua absoluta falta de má-fé -, acabaram causando-lhe indiscutíveis prejuízos políticos. O transcorrer desta discussão deixou claro que o PSOL precisa avançar no sentido das garantias fundamentais aos filiados e também no estabelecimento de limites à luta política que invade a dignidade do outro. Ataques de natureza moral entre membros do partido, na luta interna, não devem prosperar no PSOL e precisam ser devidamente sancionados. A reabilitação e o desagravo aprovados no Diretório Nacional foi uma derrota para aqueles que internamente apostam nos ataques morais como ferramenta de luta política e pode representar uma inflexão rumo à construção de uma cultura libertária de fato no ambiente da moral e da ética entre os membros do PSOL.

O debate político de balanço das eleições foi marcado por uma nítida polarização. De um lado, um setor do partido unido em torno da tese de que o PSOL saiu derrotado do 2º turno das eleições e que havia uma grave crise política e de direção no PSOL. A suposta derrota teria se dado por conta do recebimento de apoios heterodoxos às nossas candidaturas em Belém e Macapá. A suposta crise de direção se daria por conta da suposta incapacidade do presidente Ivan Valente de seguir à frente do Diretório Nacional, por conta deste ter se coadunado com esta suposta derrota. Creio que estes setores chegaram a cogitar seriamente que poderiam ter maioria no diretório – ou uma votação muito apertada, podendo assim tentar um golpe e tomar a direção do partido antes do prazo estatutário – intervalo de dois anos entre congressos. Em base a esta análise, este setor entrou na reunião do DN com duas propostas básicas: colocar o senador Randolph Rodrigues e o prefeito eleito Clécio Luís na Comissão de Ética do PSOL e também antecipar o IV Congresso do PSOL, para eleger uma nova direção. No diário carioca O Globo de sábado, 01/12, a cobertura à reunião do DN destacava que o ponto principal desta reunião seria a expulsão do único senador e do prefeito eleito de Macapá do PSOL, uma cobertura negativa que, tudo indica, foi devidamente plantada por interessados na divulgação da suposta crise do PSOL.

Aos que acompanham a dinâmica interna do PSOL com mais atenção, não é difícil perceber que existe em verdade um condomínio estabelecido neste setor do PSOL, que seria um pólo esquerdista, com variados interesses isolados, mas que se encontram de conjunto em apenas um ponto comum: enfraquecer a direção do PSOL. Dentre os interesses embutidos neste setor podemos destacar a luta pelo controle do pequeno aparato partidário e a tentativa de alavancar a pré-candidatura de Luciana Genro à presidência da República, que está inelegível na circunscrição eleitoral do seu estado, Rio Grande do Sul, por conta de seu pai ser governador, e que para se reprojetar no cenário político nacional necessita candidatar-se à presidência ou vice-presidência da República. Necessário é que se diga que deve honrar muito ao PSOL ter um quadro gabaritado como a Luciana Genro postulando esta condição, pois é uma militante que apesar da “juventude” tem uma bela história na esquerda brasileira.

 Portanto, o que liga mesmo os variados agrupamentos que convivem neste condomínio (MES, CST, CSOL, Enlace, APS , TLS, SR e outros) não são questões programáticas ou táticas de médio e longo prazos, mas questões precárias de táticas urgentes e que podem desfazer-se com pouca dificuldade, como deixou muito transparente o debate político feito no Diretório Nacional. É possível perceber vestígios de pontos comuns, no discurso, de concepção partidária, mas neste caso basta vermos como as partes que compõem este todo se comportam quando hegemônicos nos estados e municípios e verificamos que também aí a retórica é meramente tática.

Do outro lado nesta polarização, uma coalizão também ampla, mas que mostrou unidade numa questão fundamental e política de fundo: a defesa do PSOL como ferramenta política anticapitalista com forte perfil popular, portanto de massas. Outra característica também comum a esta coalizão é o desapego sincero a “siglas” internas ao PSOL, o que não é desprezível politicamente e pode não ser mera coincidência. São “dissidentes” da APS, do MES, do Enlace, do MTL, são independentes de várias origens, todos num ponto de encontro em que a defesa do PSOL anticapitalista, amplo e de massas é a moldura dentro da qual tratamos nossas saudáveis diferenças.

O centro do debate político e das polêmicas neste DN não foi o plano de ação do PSOL para o início de 2013, em que votamos por consenso a luta pela anulação da Reforma da Previdência de Lula, do fator previdenciário, a realização de seminário para buscar dar um perfil o mais uniforme possível para o PSOL nos legislativos municipais, solidariedade às lutas na Europa e realização de Seminário sobre a IRSA, ações articuladas pelo PSOL na região do semiárido nordestino sobre a seca que castiga a região, a luta contra o ACE – Acordo Coletivo Especial no setor privado que está sendo incentivado pela maioria da CUT, sobre a luta LGBT e outros. O PSOL saiu armado para incidir sobre estas questões importantíssimas da luta política e social nos próximos meses. Estas votações, praticamente consensuais, já demonstram que a tese do partido derrotado e em crise não passava de uma invenção a serviço da luta interna autofágica patrocinada por alguns segmentos internos.

O resultado das votações de avaliação das eleições mostraram uma maioria sólida negando a tese de derrota e crise do PSOL: 35 X 26. Contudo, o resultado quantitativo não reflete a flagrante derrota política verificada durante os debates, que precisamos reconhecer que foram de nível elevado – embora constrangedor em vários momentos, com uma ou outra exceção de alguns membros que pela forma e conteúdo de suas intervenções já viraram espécies de caricaturas nas instâncias do PSOL.

Um primeiro aspecto do debate que desarmou o pólo esquerdista no DN foi o fato de a maioria ter sido alcançada a partir de uma formulação política que trouxe uma autocrítica do partido em relação a aspectos da tática em Belém. Esta autocrítica foi fruto de um importante debate político, de convencimento mútuo, de busca de sínteses com honestidade e lealdade política e intelectual – método distinto daqueles que veem da fragilidade ou equívoco do outro a chance de lhe arrancar o pelo -, e que foi explicitada a partir de uma exposição de motivos contida na resolução aprovada e foi coroada com o seguinte parágrafo (39): “(Em Belém) Houve, porém, um desequilíbrio na utilização das gravações das lideranças petistas no segundo turno. Embora não se trate de negar a presença e apoio de Lula e Dilma na campanha do PSOL, deve-se registrar que embora as peças publicitárias mostrassem um apoio equilibrado e respeitoso da presidente Dilma Rousseff, que foi ao nosso programa afirmar que nosso candidato era o melhor e que faria as parcerias necessárias com o nosso governo, o apoio de Lula defendendo seu governo e suas “conquistas” pode ter gerado confusão junto ao povo quanto ao lugar do PSOL diante desse governo. A exposição deste conteúdo foi um erro. O PSOL já fez na eleição passada um gesto tão ou mais ousado, quando no Rio Grande do Sul abriu mão de uma candidatura ao senado, em plena reta final de campanha, para apoiar o então candidato Paulo Paim, do PT, que acabou se elegendo. Não é novidade, portanto, tais movimentações no PSOL. Mas é inegável que a entrada de lideranças petistas de peso em nosso programa eleitoral em Belém, ainda que apoiando o candidato do PSOL, pode ter sido interpretado como um movimento mais profundo e estratégico, o que não ocorreu absolutamente.”. Os equívocos podem e devem ser apontados, mas como aprendizado e não como condenação destrutiva do partido e suas lideranças.

Outro fator importante foram as falas de Clécio Luís, Edmilson Rodrigues e Randolphe Rodrigues, alvos maiores das críticas. Longe de serem recuadas – como talvez esperasse o bloco esquerdista, partiram do lócus respeitoso da humildade de reconhecer equívocos cometidos, mas foram de longe as mais contundentes na defesa da vitória do PSOL onde disputou o 2º turno. Tamanha a força, pertinência dos argumentos e convicção da fala de Randolphe Rodrigues, que ao seu final os presentes explodiram em “Brasil, Urgente, Randolphe Presidente!”. Foi algo emocionante, pois não foi combinado, foi verdadeiramente espontâneo.
Para além disso, restou fartamente denunciado no debate que o pólo esquerdista reúne dentro de si um conjunto de contradições que lhes tira por completo a coerência do discurso e fere de morte seus supostos melhores argumentos. A campanha eleitoral que eles apresentam como a referência para todo o PSOL é a de Marcelo Freixo no Rio de Janeiro, a chamada “Primavera Carioca”. O problema é que a Primavera Carioca teve o apoio de lideranças do PSDB no primeiro turno; recebeu R$ 200 mil do dono da Natura, Guilherme Leal, que foi candidato a vice-presidente da Marina Silva; o protagonista desta primavera, Marcelo Freixo, já adiantou que seu candidato a presidente da República em 2014 é Randolphe Rodrigues e também já disse que pode aliar-se com o PT e o PDT em eleições futuras no Rio de Janeiro. Todos estes fatos são colocados no debate e ficam sem respostas do pólo esquerdista que quer – ao que tudo indica, parasitar a figura do Freixo, o que é desmoralizante. De minha parte, acho que a campanha do Marcelo Freixo no Rio não é arranhada em absolutamente nada com os fatos narrados acima. Freixo está de parabéns pela desenvoltura, pela coragem e coerência, mas o que não deve ser admitido são os esquerdistas pintá-lo como ele não é para usá-lo como aríete para justificar um balanço negativo do PSOL em Belém e Macapá.

Não foram apenas estas contradições que levaram à derrota da lógica e do ethos do discurso dos derrotados no DN. A corrente interna que busca ser a porta-voz mais robusta deste pólo, o MES, ao longo da curta história do PSOL foi a responsável – muito corretamente e com minha aquiescência, pelo início do que pode ser chamado de elasticidade tática no PSOL. Candidaturas do MES, no PSOL, já receberam recursos de transnacionais como a Gerdau, Taurus (armas e munições), Marcopolo (metal-mecânica), e de grupos privados regionais, como o Zafari (supermercados). Projetos políticos junto à juventude, coordenados pelo MES, recebem recursos oriundos de empresas ligadas ao sistema financeiro. Em 2010 o MES retirou uma candidatura ao senado do PSOL, na reta final da campanha, para apoiar o candidato do PT, Paulo Paim. Nada disso pode ser considerado ilegal ou automaticamente transgressão aos estatutos do PSOL, mas lhes obrigaria, por coerência, a silenciar quando outros no partido se lançam em flexibilizações de natureza similar. Quando confrontados com estas cobranças, reagem mal, sobram constrangimentos e destemperos típicos de quem encerrou sua capacidade de argumentar.

Da mesma forma a CST, que por infelicidade teve um e-mail interno recentemente vazado para a Executiva Nacional, em que dizem que o Marcelo Freixo cometeu um erro grave ao receber recursos do dono da Natura, mas que deveriam silenciar diante deste fato, pois o alvo deles era Randolphe. Assim como no caso da prefeitura de Itaocara, em que secretarias estão sendo ocupadas por membros do PT, eleitos nas assembleias de base corporativa convocadas pelo futuro prefeito. Se elegerem um secretário do PMDB do Sergio Cabral, como fica? Ou ainda com o fato deste mesmo prefeito de Itaocara andar nos últimos dias por Brasília, fazendo a peregrinação pelos gabinetes “com o pires na mão”, como prefere afirmar o pólo esquerdista quando se trata de qualificar a postura de Edmilson Rodrigues e Clécio Luis, quando estes dizem que vão ter que buscar recursos nas outras esferas de governo para administrar as suas cidades. O prefeito de Itaocara está correto em buscar recursos para a sua cidade em Brasília, errados estão seus “defensores” na luta interna do PSOL, que condenam outros do PSOL que da mesma forma buscam ou buscarão estes mesmos recursos e/ou parcerias para governar.

A história é implacável, como disse Lênin, certamente baseado no critério marxista de que a prática social é o critério da verdade. Tentar encaixar a realidade concreta no saco sem fundo da retórica irresponsável, no terreno do imaginário e do virtual que não se reflete na realidade da sociedade presencial, é o caminho mais curto para a desmoralização do nosso partido junto ao povo. Se fôssemos mais rigorosos, poderíamos falar até em charlatanismo de esquerda. Os compromissos que o PSOL deve assumir com o povo devem ser aqueles que não rompam com nossa utopia socialista e nosso ideário de esquerda, mas que ao mesmo tempo não rompam com as possibilidades reais de concretização desses compromissos, nas condições objetivas dadas e que não são decretadas por discursos em auditórios com pouco público.  

Com a vitória política, numérica e moral, de uma maioria equilibrada e realista, no sentido de compreender as necessidades do nosso povo e as possibilidades do PSOL e das condições objetivas da conjuntura, o PSOL sai fortalecido deste DN, reafirmando sua perspectiva revolucionária para a realidade brasileira e seu compromisso de caminhar com o povo e seus melhores sonhos, e não distante destes. A ordem do dia agora é fortalecer nosso partido, trazer novos filiados para nossas fileiras, colocar em andamento as deliberações do diretório, governar Macapá de forma revolucionária e atuar nos parlamentos com a garra e a competência que nos mostram nossa bancada federal. Avante PSOL!

Edilson Silva - Secretário Geral do PSOL

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